Na nossa vivência acadêmica
verificou-se a existência de certo desconhecimento por parte dos estudantes do
Curso de Pedagogia do Departamento de Educação – Campus I, da necessidade de se
conhecer o afeto como constructo fundante para a prática pedagógica.
Ao analisar-se, ainda que preliminarmente, o
Currículo do Curso de Pedagogia do Departamento de Educação-Campus I, constatou-se
a inexistência de ementários, disciplinas e ou conteúdos que de algum modo
tratassem sistematicamente do afeto, como um importante conceito na formação do
professor.
Apesar de entender o sujeito como um ser
integral, o Currículo do Curso de Pedagogia enfatiza as dimensões
sócio-cultural e cognitiva, alicerçado em uma prática objetiva de “fazer educação”
desconsiderando a possibilidade de se articular uma proposta que contemple o
cotidiano do sujeito, entendendo-o com agente construtor de maneira própria de
interpretar e pensar a realidade, estabelecendo uma interface entre o social e
o psicológico (Ornellas, 2001).
Quando de sua prática
pedagógica, sobretudo em sala de aula, o professor se relaciona,
conscientemente ou não, de modo afetivo com os seus alunos. Os interesses, os
afetos, e os valores dos professores e alunos, interagem permanentemente, de
modo que é quase impossível acreditar que, ao adentrar na sala de aula, possam
deixar do lado de fora os componentes que compõem a sua subjetividade, só sendo
utilizada a sua dimensão cognitiva.
O professor desempenha o papel de mediador no
processo educativo e na aquisição da cultura por parte do aluno. Para Alencar
(2001) é muito comum verificarmos um maior comprometimento dos alunos com
aquelas disciplinas em que o professor é mais afetivo ou estabelece uma boa
relação com eles. O contrário também é observado, ao passo que, quando o aluno
não gosta do professor ou vice-versa, o ensino e a aprendizagem são afetados
por essa relação de “mal estar” em ambas as partes.
Assim,
para que a prática pedagógica na educação básica possa refletir as questões
atualmente postas sobre a relação entre cognição e afeto, é necessário rever o
currículo desse nível de ensino e ao mesmo tempo fomentar a revisão do
currículo e das práticas nos cursos de formação de professores.
Ainda
por muito tempo se discutirá a necessidade de ressignificar as propostas
curriculares que ainda reproduzem a dissocialização entre dimensão cognitiva e
dimensão afetiva. Não se pode pensar em
prática pedagógica em que o professor, por desconhecimento ou despreparo, não
sabe reconhecer os conteúdos emocionais dos estudantes e trabalhá-los de modo a
tornar a sua aprendizagem referenciada numa educação contextualizada.
Adentrando-se
no campo da subjetividade visando apimentarmos ainda mais a nossa reflexão
acrescentamos uma categoria dentro do pensamento epistemológico que merece
“ficar” temporariamente conosco nessa discussão acerca do papel do afeto na
formação do educador: os afetos.
Os
afetos representam o tema da psicologia que mais se procura explicar como
resultado da ação de sistemas externos da própria psique, alternando-se enfoques
que enfatizam seu caráter biológico ou social e que ignoram seu caráter
subjetivo. Por outro lado, os afetos também têm sido vítimas da fragmentação de
objeto do estudo da psicologia como resultado das exigências metodológicas
orientadas a apresentar o conhecimento como relação de variáveis. Dentro dessa
perspectiva epistemológica, os afetos não passaram a ser uma variável concreta
definida operacionalmente, sem nenhum tipo de relação com outros elementos ou
formações da psique.
Os
afetos representam estados de ativação psíquica e fisiológicas, resultantes de
complexos registros do organismo ante o social, o psíquico e o fisiológico. Os
afetos são verdadeiras unidades que mostram a ecologia complexa em que se
desenvolve o sujeito, e as mesmas respondem a todos os espaços constituintes
dessa ecologia. Nesse sentido, os afetos representam um dos registros mais
importantes da subjetividade humana, o que requer explicitar as possíveis vias
de seu caráter subjetivo.
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